São públicas as minhas críticas a alguns aspectos da chamada
“apologética” cristã que se faz no Brasil. Coloco entre aspas o nome do estilo
consagrado no período da Igreja Antiga, porque naquele tempo a defesa da fé era
feita em alto nível, contra os ataques de cidadãos do Império Romano contra os
cristãos e as peças eram lidas, em muitos casos, na corte, diante do Imperador.
Aqui no Brasil, em sua maioria, são ataques pessoais, críticas sem um
fundamento claro na Escritura do Novo Testamento e o pior: sem uma metodologia
adequada.
Os meus alunos já ouviram-me contar a velha história de que,
quando da minha conversão, em 1991, era “pecado” os membros das Assembleias de
Deus (na maioria delas, é verdade) assistirem televisão. No final da mesma
década era obrigatório assistir o programa de TV do pastor, para comprarmos os
produtinhos vendidos por eles, pois só com essa verba o horário no canal
poderia ser pago. Já nos anos 2000, a emissora havia sido comprada pela igreja.
Eu conto essa história para demonstrar como as “teologias”,
como as “doutrinas” e os costumes entre os chamados “ortodoxos” mudam de tempos
em tempos (Rubem Alves já disse isso bem antes de mim). Se nós mudamos de ideia
em relação a posicionamentos teológicos, bíblicos e doutrinários, que presunção
é essa que nos leva a pensar que outros grupos religiosos que se consideram
cristãos não podem mudar as suas doutrinas? Eles estão mudando e tenho notícias
sobre isso. Só nós avançamos enquanto os outros ficam congelados no tempo? Isso
é um disparate! É simplesmente irreal, uma mentira.
Há alguns anos, um conhecido apologista veio a mim pedir
orientação para produzir uma volumosa obra literária atacando uma denominação
considerada seita. Eu disse a ele que era preciso sentar-se com os líderes e
com os membros, entrevistá-los e procurar saber o que é que eles creem, como é
a vida de fé daquelas pessoas etc. Ele retrucou, dizendo que assim não poderia
“demonstrar” que eram heréticos, pois não teria como “provar pelos documentos
deles” as heresias em que acreditavam. Engano. Quem foi que disse que
entrevistas não são usadas como evidência científica? O IBGE, por exemplo, usa
qual metodologia para apresentar um retrato da nossa sociedade? São milhões de
entrevistas!
Por fim, um conhecido desse sujeito publicou uma obra que tem
sido anunciada como a mais completa contra determinada denominação “herética”.
Eu entrevistei esse autor e ele confirmou que as “descobertas surpreendentes”
dos quatro anos de pesquisa que fez estavam em documentos publicados nas
décadas de 1950 e 1980, por exemplo. Lamentável. Se em 10 ou 15 anos uma
denominação muda alguns de seus posicionamentos, que dirá em 40 ou 70 anos!
Assim, no segundo semestre de 2019, os meus alunos na
disciplina Religiões Comparadas (nos três seminários onde leciono) e eu demos
início a uma pesquisa na qual a metodologia é a entrevista estruturada e qualitativa.
Até agora foram entrevistadas 150 pessoas, entre líderes e membros de
denominações consideradas “seitas”. Esses números já me permitem escrever um
artigo científico considerável, robusto, sobre o tema da apologética no cenário
brasileiro. Mas vou seguir com as entrevistas por mais um ano.
Preliminarmente posso antecipar duas coisas. Primeiro, os
alunos relataram experiências riquíssimas no contato pessoal com outras fés.
Puderam identificar as falhas na “apologética tradicional”, quando o relato dos
entrevistados não confere com o que os apologistas dizem. Isso confirmou o que eu
disse sobre o material desatualizado produzido por esses autores e pregadores.
Além disso, a quebra de barreiras, de preconceito e estereótipos também foi
relatada pelos alunos. O ganho nessa área foi grande. A segunda coisa, eles aprenderam
que aquilo que está no papel nem sempre é o que está no dia a dia dos crentes.
Isso já foi confirmado por mim em uma experiência com uma denominação reformada
no Brasil, mas todos os alunos notaram a disparidade entre o oficial e o
oficioso. Esse aspecto é o que eu queria que o meu conhecido contornasse, mas
como ele evitou as entrevistas, acabou produzindo uma obra já desatualizada.
Por fim, o que é que salva uma pessoa, a fé em Jesus somente
(sola fide) ou a adoção de uma
doutrina completa? Primariamente, só a fé em Cristo e em sua obra, nada mais.
Se a doutrina salva, o que não é o caso, qual seria essa doutrina, haja vista
termos tantas vertentes? Se todas elas estão certas em suas bases comuns, essa
base comum é a fé, e ponto. Acredito que depois de terminar essa pesquisa,
escreverei um artigo e espero, com isso, trazer uma profunda e séria reflexão
para a Igreja brasileira, a fim de que não sejamos mais levados por informações
defasadas, por preconceitos e tendências vindas de ministérios
norte-americanos, mas que não encontram amparo na tradição milenar da fé
cristã.
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