terça-feira, 29 de outubro de 2019

TRÉPLICA DE “UM PASTOR EVANGÉLICO CHAMADO MAGNO PAGANELLI”


Uma resposta aos meus leitores

Diz o antigo ditado que “quem tem amigo não morre pagão”. Eu o parafrasearia assim: “quem é amigo do rabi Yehuda Hochman, como o prof. Franklin, não fica sem textos”, mesmo que os textos não respondam as questões importantes. Recorrer ao auxílio do rabino Hochman ajudou a dar ares de erudição, pelo que o prof. Franklin foi bastante elogiado por seus seguidores (alguns irônicos, mas que claramente não leram ou não compreenderam o meu texto).
Vi na resposta dada a mim uma intensa cortina de fumaça para os leitores. Nenhuma questão relevante do tema do conflito em si foi abordada. Ao contrário, sem saber a distinção entre um ensaio e um artigo científico ele cobrou precisão onde eu generalizei (o que é tolerável em um ensaio), mas passou de largo – ignorou de fato, onde deveria ser rigoroso. Esse recurso dele eu já havia apontado no meu texto anterior, quando escrevi: “[...] cobrança feita ao prof. Chapman, de que apresentasse Jesus como a solução para o conflito”. Ele concentrou-se e insistiu nas questões periféricas, além de distorcer minhas palavras. Por exemplo, ao citar o Líbano como uma possível democracia segundo os supostos critérios dele, eu não elogiei nem afirmei que aquele país é uma “democracia exemplar” (ele deveria ler o texto com boa vontade). Do mesmo modo, quando eu disse que a maior comunidade étnica de cristãos está no Egito, os coptas, não equivale, nem de longe, a elogiar o Egito por nada! Esse recurso da distorção deve funcionar bem com os leitores dele, mas não deu certo comigo.
Não vou estender a discussão, porque me senti bastante desrespeitado e embora não esperasse algo melhor, dei a ele o benefício da dúvida. Mas o nível não foi o que esperava. Desse modo, três pontos precisam de uma resposta.
O primeiro é periférico – mas largamente explorado na sua réplica, foi a afirmação generalizada que fiz sobre a aliança do novo Estado de Israel com a União Soviética. Ele (ou o rabino ghostwriter) negou haver essa aliança, mas confirmou que Israel comprava armas contrabandeadas da Thecoslováquia. Ora, em 1948 a Thecoslováquia se tornou um satélite da URSS, com regime comunista e tudo. Qual a novidade aqui? E qual o meu propósito ao escrever isso? Precisão histórica? Não, como eu disse, escrevi um ensaio. O que pretendi, mas ele se desviou do problema real do meu texto, foi mostrar ao prof. Franklin que nas questões ligadas a Israel ele não se importa com o regime político vigente. Já no Brasil, ao contrário, ele tem se esforçado para parecer um firme defensor da democracia de direita contra o socialismo. Qual o critério, afinal? Com isso, ele coou um mosquito e deixou passar alguns camelos, como segue.
No texto notei um autor que gosta de estatísticas ao reclamar que usei dois parágrafos apresentando minhas credenciais acadêmicas. Ele debochou, desconsiderou e fez chacota com isso. Mas foi preciso apresentar-me, haja vista eu não circular frequentemente em seminários e congressos como ele. Na academia costuma-se apresentar credenciais antes de uma intervenção, e foi o que fiz. Qual a surpresa? Mas ele (ou o rabino?) não se furtou escrever quatro longos parágrafos defendendo o indefensável e se gabando de algo que, como cristão (à exceção do rabino), não deveria se vangloriar: que os grupos “de resistência” que apresentei, formados à revelia dos britânicos mandatários, além de Jabotinsky, serem todos como “soldados da paz”. Terroristas são sempre os outros, né? Ainda hoje é assim.
As minhas afirmações sobre esses grupos e sobre Jabotinsky podem ser conferidas na obra de Antonius H. J. Gunneweg, História de Israel. As informações dadas pelo prof. Franklin têm como fonte de pesquisa o rabi Yehuda Hochman. Há norma ABNT para arrolar isso nas referências? Eu sugeri no texto anterior que procurasse a definição de “terrorismo de Estado” ou “terrorismo do alto”, mas não houve a menor consideração nem boa vontade sobre os pontos centrais do meu texto. Não se pretendeu construir um diálogo, apenas zombar, desmerecer, desqualificar. Sugiro, então, ler o manifesto de 1923, de Jabotinsky, mas fazer isso com uma lente cristã, não belicosa nem parcial, e refletir sobre o texto [1]. Os cristãos palestinos foram atingidos pelo amplo estabelecimento dos judeus na região e por terem de sujeitar a estes o controle de seus lugares sagrados [2].
Por que não dar ouvidos às reinvindicações de nossos irmãos na fé? Qual resposta foi dada aos cristãos palestinos? Eles são “menos cristãos” por terem nascido naquela região? E os árabes do mesmo modo? Isso não é preconceito? Cristo ou Paulo ou qualquer outro autor do Novo Testamento estimulam segregação dessa ordem? Na réplica, o que o prof. Franklin disse sobre os oito pontos que depõem contra o “mito da única democracia no Oriente Médio”? Silêncio.
O prof. Franklin reclamou que não respondi a nenhuma das perguntas sobre a Palestina e disse “simplificar” pedindo que que eu informasse “quando e onde existiu um país árabe chamado Palestina, e quais eram suas fronteiras e sua bandeira antes de 1948? E por que a Jordânia dominou a Cisjordânia e metade de Jerusalém durante 19 anos (1948-1967) e não fundou na época um estado palestino?”. Na verdade a resposta está dada no texto e, novamente, ele me acusa de má vontade, mas por seu turno repete a má vontade de refletir sobre as consequências do que escrevi (ele ou o rabino amigo seu). Mas eu explico melhor, repetindo a citação de Truzzi.
As relações sociais no Oriente Médio não são iguais às da Europa no mesmo período. Fronteiras rigorosamente delimitadas criando “Estados soberanos coexistentes, mas em competição” (Ferguson, 2018, p. 111), é fruto da Paz de Augsburgo, reafirmada pela Paz de Vestfália um século depois. O que marcava os territórios entre diferentes etnias árabes não era o mesmo modelo nem o rigor europeu nessas questões. É anacrônico fazer tais exigências ou mesmo comparações. E é completamente descabido cobrar de uma cultura os mesmos aspectos e especificidades de outra. Quando o prof. Franklin exige que palestinos e/ou jordanianos apresentem bandeira, certidão de nascimento etc., ele requer desses povos um modelo social, jurídico, econômico e político estranho aos seus costumes e tradições. Os judeus migrados para a Palestina sim, tinham essa noção, porque vinham da Europa. Esse é um dos (muitos) motivos do conflito: segregação de povos que estavam estabelecidos há bastante tempo num território mais amplo com sua cultura própria. Mesmo assim, diante da presença dos judeus se ampliando, os árabes instavam o estabelecimento de um governo democrático e a entrada como membro pleno da Liga das Nações desde dois anos antes da fundação do Estado de Israel (v. n. [2])
Assim, respondendo às oito perguntas sobre a Palestina no texto anterior escrito por ele, temos: “(1) quando foi fundado, e por quem?”: modelos tribais étnicos arcaicos não exigem fundação oficial nem cerimonial; os povos estavam lá  e isso bastava. “(2) quais eram suas fronteiras?”: eram estabelecidas por acordos informais, assim como os vemos, por exemplo, no Antigo Testamento (estou fazendo uma generalização para efeitos comparativos!). “(3) qual era sua capital?”: uma pergunta que não faz sentido dentro do modelo em vigor. É como perguntar qual a capital dos Tupinambás? Qual a Capital dos Navajos? “(4) como se chamavam suas principais cidades?”: se ler a minha tese (2018) sobre o turismo evangélico para a região poderá conferir o nome de algumas cidades, inclusive aprender sobre o comércio, turismo, cotidiano, rotas ferroviárias etc. na Palestina do período. “(5) quais eram suas bases econômicas?”: agrícola, comércio e turismo na virada para o século XX. “(6) quais eram suas formas de governo?”: Otomano até o final da Guerra e Mandato Britânico após ela. “(7) quem eram seus líderes antes do egípcio Yasser Arafat?”: está reconhecendo haver um líder! Então fica subentendido existir um povo, uma cultura e tudo o que negou anteriormente. “(8) que idioma falavam?”: é preciso responder a isso? Quem não sabe ter sido o árabe? Aí estão as oito respostas que eu havia dito serem respondidas, desde que se lesse o texto com boa vontade.

Reafirmo: considero ser desumano e nada cristão negar a um povo a sua identidade, e mais, o direito de defender a sua existência. Em relação aos judeus, chamam isso de antissemitismo; e em relação aos palestinos? Qual o critério do prof. Franklin nessa questão que envolve vida humanas acima de tudo e de cristãos por consequência? Em sociologia isso chama-se genocídio, mas o prof. Franklin, apoiado pelo amigo rabino, insiste na tecla do antissemitismo sem que ele faça uma autocrítica sobre as consequências do posicionamento que assume. Como mencionei, um judeu criou um jornal à época chamado The Palestine Post! Não havia “Palestina”? A Organização Sionista tinha um órgão chamado Anglo-Palestine Company, fundada em Jafa em 1903 pelo Jewish Colonial Trust, de Londres, iniciado por Herzl. Não havia “Palestina”? (Gunneweg, 2005, p. 326).
Lamentavelmente tive de ler esse texto e continuo desejando que nós, cristãos, olhemos para as questões do conflito, bem como para todas as demais questões para as quais somos arrastados, com um olhar de reconciliação (como destaquei no texto anterior). O que vamos dizer aos cristãos palestinos e às famílias palestinas pelo apoio a um Estado (qualquer que seja) e a uma ideologia? Que mensagem temos passado com essa atitude? Como ficam os povos árabes dentro do cenário das missões cristãs? Nós optamos aleatoriamente por riscá-los do mapa? Como cristão, eu não fui chamado para ter razão nem para dar a resposta final a nenhuma questão, e não espero que o prof. Franklin passe a mão na minha cabeça pelo que escrevi. De minha parte, está clara a minha perspectiva sobre o tema e o meu desgosto por não ter encontrado um interlocutor habituado ao diálogo.

Notas
[1] The Iron Wall: colonisation of Palestina: Agreement with Arabs Impossible at presente. – Zionismo must go forward. Originally published in russian under the title: O Zheleznoi Stene in Rassvyet, 4 november 1923. Também poder ler o livro que expõe esse plano em “A Muralha de Ferro – Israel e o mundo árabe”, do judeu iraquiano Avi Schlaim.
[2] Veja o ponto 6 no texto Teh Arab Case for palestine: Evidence Submited by the Arab Office, Jerusalém, to the Anglo-American Committee of inquiry, march, 1946. The Problem of Palestine. Para a arguição pela entrada como membro pleno da “ONU”, veja ponto 9.
FERGUSON, Niall. A praça e a torre. São Paulo: Planeta do Brasil, 2018.
GUNNEWEG, Antonius H. J. História de Israel, dos primórdios até Bar Kochba e de Theodor Herzl até os nossos dias. São Paulo: Teológica, 2005.


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