quinta-feira, 31 de outubro de 2019

LENDO O ANTIGO TESTAMENTO COMO CRISTÃOS


O breve texto a seguir nasceu de uma reação feita por uma leitora a respeito de um ensaio que escrevi, onde apresentei argumentos contra as afirmações que um pastor fez sobre Israel. A discussão era completamente dentro do campo das ciências sociais, não da Teologia. A leitora, por sua vez, cobrou de mim bases bíblicas para a discussão (o que não era o caso), e então eu me dispus a responder os pontos que ela apresentou.
Aqui, reproduzo uma expansão da minha resposta a ela, por entender que ainda são questões candentes para muitos e muitos cristãos hoje.
Em primeiro lugar, pessoalmente, eu penso que somente o Senhor pode dar/trazer a solução para o conflito Israel-Palestina (IP) e para os conflitos no Oriente Médio que envolvem o islã também. No entanto, como cristão e como Igreja, entendo que todos somos ordenados por Deus a trabalhar pela paz de todos os povos, indistintamente (é imperativo o cristão viver em paz com todos [Hb 12.14], ser pacificador a fim de ser chamado filho de Deus [Mt 5.9] e amar os inimigos [Mt 5.43-44]). Tomar partidos, lados, posicionamentos ideológicos ou nacionalistas não é a vocação da Igreja.
A leitora cobrou posição sobre as promessas de Deus em relação a Israel, afirmando que as mesmas são eternas e irrevogáveis. Ela reafirmou o seu entendimento de que a terra é do povo de Israel. A isso eu respondo que irá depender de como lemos as Escrituras. Podemos ler o que está no Antigo Testamento e permanecermos naquele ambiente, usando interpretações judaicas (e até sionistas, o que penso ser pior). Mas podemos ler o Antigo Testamento como cristãos, com as “lentes” do Novo Testamento, dadas para nós pelos autores que escreveram essa parte da Bíblia. Penso que devemos nos apoiar no que os autores inspirados por Deus escreveram. E no Novo Testamento, leio em Hebreus 11.8-9 que o recebedor da tal promessa “irrevogável”, o patriarca Abraão (quem mais que ele deveria tomar posse da terra?!) peregrinou por ela como se fosse estrangeiro! Ele não considerou a terra material, geográfica, com apego material indisputável, de onde não deveria arredar o pé. Sabemos que as coisas de Deus se dão e acontecem pela fé e já eram assim desde Abraão, o pai da fé. Ele entendeu isso, mas cristãos hoje não compreendem.
Aprendo com essa passagem que as promessas de Deus são irrevogáveis, sim, mas o contexto e as condições de recebimento dessas promessas precisam ser compreendidos e aprofundados. Deus fez pactos com Abraão e com Davi e ambos encontram cumprimento na pessoa de Jesus, por isso são eternos! Assim é que Paulo (vamos duvidar dele, um judeu chamado por Cristo?), ao escrever Gálatas 3.16, nos ensinou que a promessa de posse da terra a ser dada “ao seu descendente”, que a leitora chamou irrevogável, não encontrou cumprimento no povo judeu coletivamente, mas novamente em Jesus! O texto diz: “Não aos descendentes, como se falando de muitos, mas em um só, que é Jesus”. Isso confirma o que estou argumentando.
Do mesmo modo acontece com o outro pacto eterno, de que não faltaria sucessor no trono de Davi. Aprendemos com Pedro (seria ele ignorante a esse respeito?) que a “promessa irrevogável” de sucessor no trono de Israel também encontra cumprimento na pessoa de Jesus. Diz Atos 2.29-35, bem claro:

“Irmãos, posso dizer-lhes com franqueza que o patriarca Davi morreu e foi sepultado, e o seu túmulo está entre nós até o dia de hoje. Mas ele era profeta e sabia que Deus lhe prometera sob juramento que colocaria um dos seus descendentes em seu trono. Prevendo isso, falou da ressurreição do Cristo, que não foi abandonado no sepulcro e cujo corpo não sofreu decomposição. Deus ressuscitou este Jesus, e todos nós somos testemunhas desse fato. Exaltado à direita de Deus, ele recebeu do Pai o Espírito Santo prometido e derramou o que vocês agora veem e ouvem. Pois Davi não subiu ao céu, mas ele mesmo declarou: ‘O Senhor disse ao meu Senhor: Senta-te à minha direita até que eu ponha os teus inimigos como estrado para os teus pés’.” (ênfases acrescentadas)

Quando os hebreus saíram do Egito, Deus prometeu a ocupação da terra aos judeus. Mas o Salmo 24 diz que a terra toda é do Senhor. Por isso, Êxodo 22.21-23 diz para não maltratar o estrangeiro. Árabes e palestinos são estrangeiros? Se maltratassem haveria punição. Da terra de Deus, os povos devem retirar o seu sustento, porque ela é do Senhor (Salmo 24.1). Não se pode vender nem comprar a terra, diz o Levítico 25.23 (se tomarmos esse texto rigorosamente, qual a posição adotar?).
Outra questão levantada (não pela leitora, mas por outro leitor), é que Isaías 66.8 se cumpriu em 14 de maio de 1948, quando David Bem Guryon declarou a independência do Estado de Israel. O texto diz: “Quem jamais ouviu tal coisa? Quem viu coisas semelhantes? Poder-se-ia fazer nascer uma terra num só dia? Nasceria uma nação de uma só vez? Mas Sião esteve de parto e já deu à luz seus filhos” (fui informado por um conhecido que essa ideia foi defendida na Revista Jovens 2º Trimestre 2015. Rio de Janeiro: CPAD. Tema: Jesus e o seu tempo).
A primeira lição de interpretação de textos (hermenêutica) é a consideração dos contextos imediato e remoto. Dizer que a assembleia que declarou o início do moderno Estado de Israel fez cumprir a profecia de Isaias é algo bastante reducionista. Se o autor da revista ou qualquer leitor voltar apenas um versículo, lerá o seguinte: “Antes de entrar em trabalho de parto, ela dá à luz; antes de lhe sobrevirem as dores, ela ganha um menino.” Na tradição cristã, quem é “o menino”, Jesus ou um país que surgiu no século XX? Veja também o contexto remoto em Isaias 9.3-6 em que fala do surgimento de uma nação, mas concluir dizendo que “um menino nos nasceu, um filho nos foi dado, e o governo está sobre os seus ombros. E ele será chamado Maravilhoso Conselheiro, Deus Poderoso, Pai Eterno, Príncipe da Paz.” Alguma dúvida?
Agora vejamos o que o Novo Testamento diz sobre essa nação. Ela nasceria num só dia, e Jesus nasceu num só dia. Ao nascer esse menino, muitos creriam Nele, formando um só povo, isto é, a nação que Pedro chamou de “geração eleita, sacerdócio real, nação santa, povo exclusivo de Deus, para anunciar as grandezas daquele que os chamou das trevas para a sua maravilhosa luz”. (1Pedro, 2.9, ênfase acrescentada). Assim, o que surgiu num só dia como profetizado por Isaias foi o Cristo e nele nasceu a Igreja.
Não podemos abrir mão dessa interpretação sob risco de interpretarmos a Escritura de maneira completamente descontextualizada. Por hora é o que precisamos compreender.

= = = = = = = = = = = = = = = = = = = = = = = = =
INSCREVA-SE NO MEU CANAL DO YOUTUBE E CONHEÇA OS MEUS CURSOS ONLINE

INSCRIÇÃO PARA CURSO "DIACONIA: HISTÓRIA E TEOLOGIA DO SERVIÇO CRISTÃO:

#israel #palestina #conflitoisraelpalestina #dispensacionalismo #magnopaganelli #terradeisrael #evangelicoseisrael #povodedeus #sionismo #antissemitismo #sionismocristao #sionismoevangelico


Nenhum comentário:

Postar um comentário